hoyer15_LightFieldStudiosGetty Images_worldhealth LightFieldStudios/Getty Images

A saúde global é o melhor investimento que podemos fazer

LUXEMBURGO – Ninguém poderia prever até que ponto a COVID-19 corroeria décadas de progresso na saúde pública global. E o mundo ainda está a recuperar do choque. Mas temos a oportunidade – e o dever – de tirar as lições certas desta situação, de forma a mitigar a pandemia em curso, minimizando o risco de eventos semelhantes no futuro.

Embora existam novas ameaças no horizonte, não podemos permitir que o nosso foco se afaste da COVID-19. A pandemia destacou lacunas significativas nos nossos sistemas globais de saúde. Deixá-los sem solução seria uma má política pública e má economia, porque nunca poderá haver um compromisso entre a saúde e o desenvolvimento económico. A COVID-19 demonstrou que a saúde é fundamental para o desenvolvimento, a prosperidade e a segurança nacional.

As interrupções nos serviços de saúde, durante a pandemia, resultaram em picos de VIH, tuberculose, malária e muitas doenças não transmissíveis – tanto de casos como de mortes que não foram comunicados. O mundo já tinha feito grandes avanços no controlo de todas essas doenças. Para piorar a situação, a pandemia levou à diminuição da esperança de vida, menor cobertura de vacinação básica e aumento dos desafios psicossociais e de saúde mental.

Para agravar o legado doloroso da pandemia, a guerra na Ucrânia desencadeou uma extensa crise humanitária, colocou em risco o abastecimento mundial de alimentos, aumentou os preços dos alimentos e da energia e ameaça provocar uma recessão e dificuldades económicas em todo o mundo. Em setembro, o Fundo Monetário Internacional alertou que “o impacto dos custos mais altos de importação de alimentos e fertilizantes, para aqueles altamente expostos à insegurança alimentar, adicionará 9 mil milhões de dólares às pressões sobre a balança de pagamentos – em 2022 e 2023. Isso consumirá pouco a pouco as reservas internacionais dos países e as respetivas capacidades de pagar pelas importações de alimentos e fertilizantes”.

Além disso, as taxas de juro mais altas e condições financeiras mais restritivas aumentaram o espectro do sobreendividamento generalizado nos países de baixo e médio rendimento. Ao submeterem as finanças públicas a uma grande pressão, os recentes choques globais colocaram em risco o investimento vital e a longo prazo na saúde.

A solidariedade e a equidade globais são os alicerces de qualquer resposta eficaz aos desafios que enfrentamos. Temos de avançar em três frentes para preservar o papel central que os sistemas de saúde – e mais precisamente os cuidados de saúde primários – desempenham em todos os momentos e, principalmente, quando as crises económicas nos atingem.

Winter Sale: Save 40% on a new PS subscription
PS_Sales_Winter_1333x1000 AI

Winter Sale: Save 40% on a new PS subscription

At a time of escalating global turmoil, there is an urgent need for incisive, informed analysis of the issues and questions driving the news – just what PS has always provided.

Subscribe to Digital or Digital Plus now to secure your discount.

Subscribe Now

Em primeiro lugar, o investimento nos cuidados de saúde primários tem de aumentar, porque as lacunas no investimento em saúde aumentam durante tempos difíceis, como o que estamos a vivenciar agora. Essas lacunas, por sua vez, aumentam os riscos que as pessoas enfrentam, provenientes de ameaças globais, causadas pelo homem ou não. É do interesse de todos ajudar todos os países que não tenham recursos para investir suficientemente na resiliência do sistema de saúde e na preparação e na resposta contra pandemias.

Em segundo lugar, a inovação na área de ciências da vida precisa de mais financiamento, principalmente para expandi-la de forma sustentável. Isso significa apoiar a produção local ou inovações na prestação de serviços de saúde mental que atingem milhões de pessoas e estão incorporados ao sistema de cuidados de saúde primários.

Em terceiro lugar, as organizações multilaterais devem colaborar para nos prepararem, no sentido de enfrentarmos futuras ameaças à saúde de forma mais eficaz. Aqui, iniciativas como um acordo pandémico juridicamente vinculativo, desenvolvido e ratificado pelos países e enraizado na constituição da Organização Mundial de Saúde, pode fornecer o manual desesperadamente necessário para prevenir e dar respostas às pandemias.

Infelizmente, mesmo antes de a COVID-19 aparecer, o mundo estava a ficar para trás na corrida para alcançar as metas de saúde mundialmente acordadas, inclusive muitas das consagradas nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030. A pandemia atrasou-nos ainda mais.

Numa altura em que a dívida cresce e os riscos aumentam para a sustentabilidade da dívida, tanto os governos, como as organizações internacionais e as instituições financeiras têm de cooperar estreitamente para nos colocarem novamente no caminho certo. Ao ilustrar as muitas falhas que existem na cooperação mundial, a COVID-19 também demonstrou a importância de trabalharmos juntos.

É por isso que as nossas duas organizações se comprometeram a unir os pontos fortes de cada uma, para promover e aumentar os investimentos na saúde.

Por exemplo, com o apoio do Banco Europeu de Investimento, da OMS, da Wellcome Trust e outros, o AMR Action Fund está a investir em soluções inovadoras para combater a resistência antimicrobiana e garantir que haja uma fonte de aprovisionamento de novos medicamentos para atender às principais necessidades. A comunidade científica já identifica a resistência antimicrobiana como “a pandemia silenciosa” e uma séria ameaça à saúde e ao desenvolvimento globais.

Além disso, estamos a trabalhar para canalizar recursos adicionais provenientes de outros parceiros, como a Comissão Europeia, instituições de financiamento do desenvolvimento e atores do setor privado, para impulsionar os serviços de saúde onde são mais necessários. No início deste ano, anunciámos uma parceria, em cooperação com a Comissão Europeia e a União Africana, para fortalecer os sistemas de saúde, em particular os cuidados de saúde primários, em África. O BEI comprometeu-se a disponibilizar, pelo menos, 500 milhões de euros (520 milhões de dólares) para mobilizar mais de mil milhões de euros em investimentos, com especial ênfase nos cuidados de saúde primários na África Subsariana.

Já há novos projetos cooperativos a avançar em África e no Médio Oriente. No Ruanda, a OMS irá aconselhar diretamente o governo na reconstrução do Laboratório Nacional de Saúde, com financiamento da Comissão Europeia e do BEI. O novo laboratório realizará mais de 80 mil testes por ano, servindo uma população de mais de 12 milhões de pessoas.

Para haver um impacto mensurável nesses países, focamo-nos no uso de mecanismos financeiros inovadores que estimulem o financiamento interno e promovam o nosso objetivo comum de saúde para todos. Ao mesmo tempo, estamos comprometidos em promover a sustentabilidade na gestão da dívida, para que os investimentos na saúde dos países nossos parceiros não resultem em problemas financeiros. Mais uma vez, investir na saúde é promover uma boa política económica.

Boa saúde e bem-estar são objetivos que o mundo inteiro tem em comum. Para acelerar a utilização eficaz de soluções de saúde inovadoras, os países e as instituições têm de trabalhar juntos, fomentando a cooperação não apenas entre os estados, mas também entre os governos e o setor privado.

https://prosyn.org/KLcbufEpt