Para endereçar esta crise dupla ao ritmo e escala necessários, a comunidade internacional tem de alterar a sua abordagem. Historicamente, os acordos globais para endereçar as alterações climáticas e a perda da biodiversidade têm sido negociados separadamente, apesar de as duas questões estarem estreitamente relacionadas. Além disso, o processo tem sido ensombrado por disparidades estruturais, desequilíbrios de poder e a priorização de interesses nacionais e comerciais sobre o bem comum global.
Nem as sociedades humanas nem os sistemas naturais que as suportam podem funcionar bem de forma isolada. Os desafios interligados, dinâmicos e complexos exigem soluções baseadas no pensamento sistémico e uma consideração plena de todos os dados. Mas os conjuntos de dados relevantes são enormes e estão em constante mudança. Não podemos navegá-los sozinhos. Precisamos de um co-piloto.
No seguimento de avanços recentes, a inteligência artificial poderia desempenhar este papel. A tecnologia já comprovou ser muito útil para analisar conjuntos enormes de dados, para identificar padrões e para prever comportamentos. Poderia também ser a chave para resolver as crises interrelacionadas do clima, da biodiversidade e da desigualdade, a começar pelas mesas de negociações internacionais.
Por exemplo, a IA poderia melhorar imenso as negociações internacionais, através do destaque das até agora negligenciadas ligações entre a biodiversidade e as questões climáticas. Essas conclusões justificariam um relacionamento mais formalizado e interrelacionado entre a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas e a Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica, os dois organismos que têm negociado acordos de forma separada.
A IA também poderia esclarecer os efeitos mais amplos de acordos como o Paris sobre o clima, e as muitas iniciativas sectoriais incipientes centradas em questões como a água, a segurança energética e os oceanos. Até agora, foram já negociados pelo menos 250 000 tratados que pretendem aprofundar a cooperação global, mas o efeito mais alargado de toda esta diplomacia permanece abaixo do esperado.
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As capacidades preditivas e a precisão analítica da IA poderiam ajudar a resolver este desafio. Através do processamento das enormes quantidades de dados associados a estes tratados, a IA pode identificar conflitos, contradições ou lacunas, ajudando dessa forma a impedir a duplicação de esforços, a resolver discordâncias e a garantir que não ficam questões importantes por tratar.
Um exemplo deste potencial pode ser visto no reino dos acordos comerciais. O Legal Analytics Lab da Universidade do Estado da Geórgia está a usar a IA para identificar as cláusulas legais específicas que têm maior influência sobre as disputas comerciais e para compreender como a redacção dos tratados afecta os resultados das disputas internacionais. De forma semelhante, a IA poderia ser usada para analisar tratados ambientais que determinassem os factores ou cláusulas que levam a bons resultados ambientais ou para identificar conflitos potenciais entre tratados.
Além disso, a IA também pode facilitar a criação de uma base de dados global de tratados, na qual os negociadores pudessem pesquisar rapidamente os acordos existentes à procura de provisões semelhantes, consultar precedentes e evitar contradições. Um sistema desta natureza garantiria a harmonização dos tratados, promovendo um ecossistema diplomático global mais eficaz.
Finalmente, ao permitir que os países de baixos e médios rendimentos acedam às mais avançadas análises de dados disponíveis, a IA também poderia ajudar a corrigir os desequilíbrios de poder que sufocam os avanços genuínos relativamente às alterações climáticas e à biodiversidade. As parcerias entre os principais programadores de IA e os países em desenvolvimento poderiam criar ferramentas para reunir todos os dados relevantes sobre a biodiversidade, o clima e a economia de um país num formato acessível.
Enquanto os países mais ricos participam normalmente nas negociações globais com enormes grupos de advogados e analistas bastante dinâmicos, os países de rendimentos mais baixos enfrentam frequentemente dificuldades para enviar um único representante. Esta disparidade esteve em evidência na Conferência da ONU sobre as Alterações Climáticas (COP27) do ano passado. Apesar de a reunião ter conseguido uma representação mais equilibrada do que as COP anteriores, a maior delegação, dos Emirados Árabes Unidos, tinha mais de 1000 pessoas, enquanto mais de 100 países tinham 50 ou menos delegados, tendo vários países enviado apenas um ou dois. Com a IA, países tão pequenos como o Butão (que enviou 15 delegados à COP27) poderiam subitamente aceder aos mesmos dados e capacidades analíticas que países com exércitos de especialistas.
Mas a questão não se esgota nos números. Os países de baixos rendimentos ainda estão a tentar recuperar em termos da experiência tecnológica e da investigação, e esta assimetria está a ser agravada pelo fosso digital global. Segundo a Conferência da ONU sobre o Comércio e o Desenvolvimento, os Estados Unidos e a China são conjuntamente responsáveis por 50% dos maiores centros de dados mundiais, por 70% dos principais investigadores mundiais de IA e por 94% de todo o financiamento para start-ups de IA.
Conseguiremos ultrapassar os efeitos dessa concentração se disponibilizarmos co-pilotos de IA aos países em desenvolvimento, em vez de esperarmos por que estes desenvolvam as suas próprias tecnologias de origem local. Isto permitiria que os delegados avaliassem as implicações dos acordos negociados para as leis, capacidades e interesses em tempo real dos seus países, o que melhoraria imensamente a sua tomada de decisões.
Evidentemente, a IA não é uma solução milagrosa e, como observou recentemente Bill Gates, envolve alguns riscos. A IA não consegue substituir a criatividade, a intuição e a inteligência humanas. Apesar de poder ser usada para analisar dados com velocidade e precisão sem igual, não consegue tomar decisões éticas nem determinar a justeza dos resultados. Adicionalmente, os algoritmos em que a IA se baseia podem eles mesmos estar sujeitos a enviesamentos profundamente enraizados. As decisões éticas e políticas ainda necessitarão de intervenção humana e empática.
Para pilotarmos a revolução da IA, temos de compreender o potencial e as limitações da tecnologia, além das nossas próprias responsabilidades para garantir a sua utilização justa e ética. Temos de nos precaver relativamente a dados enviesados e de permanecer vigilantes contra intrusões e manipulações potenciais. Se conseguirmos fazer isso, poderemos seguir em frente para o objectivo de construir um futuro sustentável e justo, mesmo numa altura em que a esperança perde terreno na imaginação do público.
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Donald Trump's return to the White House will almost certainly trigger an unmanaged decoupling of the world’s most important geopolitical relationship, increasing the risk of global economic disruption and crisis. After all, Chinese leaders will be far less conciliatory than they were during his first term.
thinks Xi Jinping's government will be less accommodative of the “Tariff Man's” demands this time around.
No matter how committed Donald Trump and his oligarch cronies are to a tax cut, the laws of arithmetic cannot be repealed. If only a handful of Republican lawmakers keep their promise not to increase the US budget deficit, there is no way that the incoming administration can enact its economic agenda and keep the government running.
points out that no amount of bluster or strong-arming can overcome the laws of arithmetic.
CAMBRIDGE – Com o mundo a caminho de ultrapassar os 1,5° Celsius de aquecimento na próxima década, podemos prever que os riscos climáticos se intensifiquem, empurrando mais milhões de pessoas para a fome, provocando bilhões de dólares de prejuízos e prejudicando de forma desproporcional os países que menos contribuíram para o problema. Pior ainda, estamos perante uma crise global da biodiversidade: os ecossistemas estão a degradar-se ao ponto do colapso e as extinções de espécies estão a acelerar a um ritmo assustador. Também aqui os mais desfavorecidos são afectados de forma desproporcional.
Para endereçar esta crise dupla ao ritmo e escala necessários, a comunidade internacional tem de alterar a sua abordagem. Historicamente, os acordos globais para endereçar as alterações climáticas e a perda da biodiversidade têm sido negociados separadamente, apesar de as duas questões estarem estreitamente relacionadas. Além disso, o processo tem sido ensombrado por disparidades estruturais, desequilíbrios de poder e a priorização de interesses nacionais e comerciais sobre o bem comum global.
Nem as sociedades humanas nem os sistemas naturais que as suportam podem funcionar bem de forma isolada. Os desafios interligados, dinâmicos e complexos exigem soluções baseadas no pensamento sistémico e uma consideração plena de todos os dados. Mas os conjuntos de dados relevantes são enormes e estão em constante mudança. Não podemos navegá-los sozinhos. Precisamos de um co-piloto.
No seguimento de avanços recentes, a inteligência artificial poderia desempenhar este papel. A tecnologia já comprovou ser muito útil para analisar conjuntos enormes de dados, para identificar padrões e para prever comportamentos. Poderia também ser a chave para resolver as crises interrelacionadas do clima, da biodiversidade e da desigualdade, a começar pelas mesas de negociações internacionais.
Por exemplo, a IA poderia melhorar imenso as negociações internacionais, através do destaque das até agora negligenciadas ligações entre a biodiversidade e as questões climáticas. Essas conclusões justificariam um relacionamento mais formalizado e interrelacionado entre a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas e a Convenção da ONU sobre Diversidade Biológica, os dois organismos que têm negociado acordos de forma separada.
A IA também poderia esclarecer os efeitos mais amplos de acordos como o Paris sobre o clima, e as muitas iniciativas sectoriais incipientes centradas em questões como a água, a segurança energética e os oceanos. Até agora, foram já negociados pelo menos 250 000 tratados que pretendem aprofundar a cooperação global, mas o efeito mais alargado de toda esta diplomacia permanece abaixo do esperado.
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Um exemplo deste potencial pode ser visto no reino dos acordos comerciais. O Legal Analytics Lab da Universidade do Estado da Geórgia está a usar a IA para identificar as cláusulas legais específicas que têm maior influência sobre as disputas comerciais e para compreender como a redacção dos tratados afecta os resultados das disputas internacionais. De forma semelhante, a IA poderia ser usada para analisar tratados ambientais que determinassem os factores ou cláusulas que levam a bons resultados ambientais ou para identificar conflitos potenciais entre tratados.
Além disso, a IA também pode facilitar a criação de uma base de dados global de tratados, na qual os negociadores pudessem pesquisar rapidamente os acordos existentes à procura de provisões semelhantes, consultar precedentes e evitar contradições. Um sistema desta natureza garantiria a harmonização dos tratados, promovendo um ecossistema diplomático global mais eficaz.
Finalmente, ao permitir que os países de baixos e médios rendimentos acedam às mais avançadas análises de dados disponíveis, a IA também poderia ajudar a corrigir os desequilíbrios de poder que sufocam os avanços genuínos relativamente às alterações climáticas e à biodiversidade. As parcerias entre os principais programadores de IA e os países em desenvolvimento poderiam criar ferramentas para reunir todos os dados relevantes sobre a biodiversidade, o clima e a economia de um país num formato acessível.
Enquanto os países mais ricos participam normalmente nas negociações globais com enormes grupos de advogados e analistas bastante dinâmicos, os países de rendimentos mais baixos enfrentam frequentemente dificuldades para enviar um único representante. Esta disparidade esteve em evidência na Conferência da ONU sobre as Alterações Climáticas (COP27) do ano passado. Apesar de a reunião ter conseguido uma representação mais equilibrada do que as COP anteriores, a maior delegação, dos Emirados Árabes Unidos, tinha mais de 1000 pessoas, enquanto mais de 100 países tinham 50 ou menos delegados, tendo vários países enviado apenas um ou dois. Com a IA, países tão pequenos como o Butão (que enviou 15 delegados à COP27) poderiam subitamente aceder aos mesmos dados e capacidades analíticas que países com exércitos de especialistas.
Mas a questão não se esgota nos números. Os países de baixos rendimentos ainda estão a tentar recuperar em termos da experiência tecnológica e da investigação, e esta assimetria está a ser agravada pelo fosso digital global. Segundo a Conferência da ONU sobre o Comércio e o Desenvolvimento, os Estados Unidos e a China são conjuntamente responsáveis por 50% dos maiores centros de dados mundiais, por 70% dos principais investigadores mundiais de IA e por 94% de todo o financiamento para start-ups de IA.
Conseguiremos ultrapassar os efeitos dessa concentração se disponibilizarmos co-pilotos de IA aos países em desenvolvimento, em vez de esperarmos por que estes desenvolvam as suas próprias tecnologias de origem local. Isto permitiria que os delegados avaliassem as implicações dos acordos negociados para as leis, capacidades e interesses em tempo real dos seus países, o que melhoraria imensamente a sua tomada de decisões.
Evidentemente, a IA não é uma solução milagrosa e, como observou recentemente Bill Gates, envolve alguns riscos. A IA não consegue substituir a criatividade, a intuição e a inteligência humanas. Apesar de poder ser usada para analisar dados com velocidade e precisão sem igual, não consegue tomar decisões éticas nem determinar a justeza dos resultados. Adicionalmente, os algoritmos em que a IA se baseia podem eles mesmos estar sujeitos a enviesamentos profundamente enraizados. As decisões éticas e políticas ainda necessitarão de intervenção humana e empática.
Para pilotarmos a revolução da IA, temos de compreender o potencial e as limitações da tecnologia, além das nossas próprias responsabilidades para garantir a sua utilização justa e ética. Temos de nos precaver relativamente a dados enviesados e de permanecer vigilantes contra intrusões e manipulações potenciais. Se conseguirmos fazer isso, poderemos seguir em frente para o objectivo de construir um futuro sustentável e justo, mesmo numa altura em que a esperança perde terreno na imaginação do público.