A Resiliência da Política Externa Europeia

RIGA – Durante décadas, as pessoas queixaram-se do abrandamento do poder político global da Europa. Para adicionar alguma precisão ao debate, em 2010 ajudámos a escrever o primeiro quadro de resultados de Política Externa do Conselho Europeu de Relações Exteriores. Na altura, escrevemos – de um modo suave – que a Europa se tinha “distraído” com a crise do euro. No fim de 2012, a crise podia ser considerada menos aguda. No entanto, os líderes Europeus continuaram a dedicar mais tempo e esforços às questões financeiras e institucionais do que às questões geopolíticas.

Sem dúvida que a imagem e o poder diplomático da Europa continuaram a diluir-se por todo o mundo (embora seja difícil quantificar uma tal tendência), à medida que os estados membros insistiam em cortes nos orçamentos da defesa e do desenvolvimento. A boa notícia, no entanto, é que a política externa Europeia não se desagregou com a crise. Na verdade, até mostrou alguns sinais de progresso.

A União Europeia conseguiu preservar a essência do seu acquis diplomatique (NdT – acervo diplomático, em francês no original). Com efeito, a avaliação feita no âmbito do Quadro de Resultados sobre o desempenho da política externa Europeia em 2012 mostra sinais modestos de estabilização e resiliência. Embora a UE não tenha tido sucessos relevantes, comparáveis à intervenção militar na Líbia em 2011, teve um desempenho surpreendentemente favorável nas suas relações externas – especialmente dada a profunda crise com a qual continuou a lidar.

Para começar, a coerência das políticas Europeias relativamente à Rússia melhorou: a UE ameaçou utilizar o mecanismo de resolução de disputas da Organização Mundial do Comércio quando o Kremlin anunciou novas medidas proteccionistas no fim de 2012. Também lançou uma investigação a práticas contra a concorrência, ao gigante Russo do gás Gazprom, e criticou os abusos no campo dos direitos humanos durante a repressão às manifestações que acompanharam as eleições de Março responsáveis pelo regresso de Vladimir Putin à presidência.

Também existiram sinais de melhoria modesta nas relações da Europa com a China, apesar de uma falta de unidade que continuou a comprometer o seu poder efectivo. Foram também lançadas novas missões da UE no Níger, no Sudão do Sul, e no Corno de África, sob a égide da Política de Defesa e Segurança Comum – algo que não tinha acontecido nos últimos dois anos.

Claro que também houve áreas onde os Europeus tiveram um desempenho menos bom. Acima de tudo, não conseguiram quebrar o frustrante impasse diplomático na Síria ou impedir aí o escalar da violência, à medida que o ano progredia. Os Europeus permaneceram divididos sobre o conflito Israelo-Palestiniano (embora num grau menor do que em anos anteriores), e não conseguiram ter um impacto na votação das Nações Unidas de Novembro, para elevação do estatuto da Palestina. Também tiveram dificuldades em concertar uma abordagem única relativamente ao Azerbaijão e à Ucrânia, e continuaram a procurar uma abordagem coerente quanto à Turquia, à medida que as negociações para a adesão permaneceram bloqueadas.

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Mesmo assim, o desempenho da política externa da UE em 2012 foi globalmente positivo. Falta agora ver se esta dinâmica se conseguirá manter, o que dependerá em grande parte do facto de a UE conseguir ultrapassar a crise económica (que continua a piorar em vários países membros), restabelecer o crescimento, e diminuir o desemprego. Neste sentido, os líderes Europeus fazem bem em focar-se na resolução da crise financeira na zona euro.

Quaisquer ganhos futuros na influência global, no entanto, obrigarão os Europeus a ultrapassar as suas divisões internas e a melhorar a sua coordenação na política externa. Em particular, o sucesso implicará transformar o Serviço Europeu de Acção Externa (SEAE) num corpo diplomático eficaz que possa converter os enormes recursos da UE num poder real.

O futuro próximo apresenta uma lista crescente de desafios. Já existem indicações de parceiros estratégicos importantes que começam a encarar a crise europeia como a “nova normalidade”; por outras palavras, estão a desenvolver planeamentos para um futuro em que o poder Europeu continua a sofrer de erosão. A falta de uma estratégia colectiva de defesa na Europa, juntamente com um investimento decrescente na capacidade militar, é também um obstáculo sério para a continuação da sua influência como interveniente na segurança global.

Isso faz com que seja ainda mais importante para o SEAE coordenar a Política de Defesa e Segurança Comum com esforços mais amplos de política externa. Esta é uma tarefa aterradora, dada a actual estrutura da UE. O espectro de uma retirada Britânica da UE não facilitará as coisas.

A “rotação” dos EUA para a Ásia ainda aumenta mais a pressão sobre a Europa para lidar com a sua própria vizinhança. Embora a política externa da UE para com a Rússia se tenha tornado mais eficaz, as tensões têm crescido – e deverão continuar nesse caminho. A insegurança na região Africana do Sahel, uma preocupação crescente já em 2012, levou a que, no primeiro mês de 2013, um estado membro da UE tenha entrado em guerra numa região não muito distante dos limites da Europa. Provavelmente, os Europeus também terão que lidar com as repercussões da tentativa de tomada do poder no Mali no último ano, por grupos Islamitas rebeldes, ao mesmo tempo que as consequências a longo prazo dos desenvolvimentos no Sahel serão certamente sentidas em anos vindouros.

Apesar da gravidade da crise europeia, a máquina da política externa da UE (tal como subsiste actualmente) continuou a funcionar em 2012, com resultados moderadamente bem-sucedidos. No entanto, é improvável que a mera subsistência seja suficiente para lidar com os desafios que a Europa deverá enfrentar este ano. A UE precisará de fazer mais – e de fazê-lo melhor. Continuamos esperançados de que estará à altura da tarefa.

Traduzido do inglês por António Chagas

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