A Opção de Marrocos

RABAT – Três anos após as revoluções da Primavera Árabe, o mundo democrático parece mais confuso do que nunca sobre a forma de reagir. O Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, relançou esforços de mediação norte-americana no Médio Oriente, num momento em que os parceiros mais confiáveis do seu país estão antagonizados: Os governantes militares do Egipto não vêem com bons olhos o apoio inicial do Ocidente à Irmandade Muçulmana de Mohamed Morsi durante o seu mandato presidencial e a Arábia Saudita receia que o Irão possa vir a tornar-se uma hegemonia regional ainda mais ambiciosa, se encetar negociações com os EUA.

Foi perante este cenário que o Rei de Marrocos, Mohammed VI, convocou recentemente uma reunião de alto nível do Comité Al Quds, a que preside. A cimeira de dois dias contou com a presença do presidente da Autoridade Palestiniana, de membros de alto nível do corpo diplomático dos países envolvidos no processo de paz entre a Palestina e Israel e do secretário-geral da Organização de Cooperação Islâmica. Realizando-se num momento que é crítico para esta sensível região, a reunião constituiu um esforço no sentido de contribuir para as novas negociações e desenvolveu os esforços de Kerry para reavivar o processo de paz.

Marrocos é um cenário ideal em termos de diplomacia regional. A sua estratégia de reforma gradual, a modernização da economia e o desenvolvimento social transformaram o país num oásis de estabilidade numa região repleta de violência e de rivalidades estratégicas - e, consequentemente, num parceiro confiável para a Europa e para os Estados Unidos, que procuram influenciar os acontecimentos no Norte de África e em todo o Médio Oriente. Com efeito, a proximidade de Marrocos com a Europa faz do país uma porta de entrada para África e o seu potencial económico e geopolítico ainda não foi avaliado.

Em contrapartida, os esforços do governo egípcio para suprimir a Irmandade Muçulmana estão a alimentar uma agitação aparentemente interminável. E a Tunísia ainda não tem um Primeiro-Ministro para chefiar o governo provisório, situação que está a atrasar ainda mais o "diálogo nacional" que a União Geral dos Trabalhadores da Tunísia concordou em mediar. Três anos após o início das suas revoluções, nenhum dos países conseguiu redigir uma constituição amplamente aceitável.

Entretanto, a Argélia está ocupada com as eleições presidenciais de Abril, às quais o actual Presidente, Abdelaziz Bouteflika, voltará a candidatar-se. A política da Mauritânia encontra-se polarizada e o governo mostra-se incapaz de restabelecer a confiança. A Líbia está à beira da guerra civil e da divisão de facto. Mais longe, na Síria, vive-se um clima de derramamento de sangue e de sofrimento.

A abordagem evolutiva de Marrocos no sentido de melhorar o bem-estar do país - prosseguindo, de forma discreta e resoluta, as reformas políticas, económicas e sociais lançadas há mais de uma década - é apoiada pela grande maioria dos cidadãos. A nova Constituição, proposta pelo rei e aprovada em referendo, em Julho de 2011, causou já forte concorrência política. Entretanto, uma nova Iniciativa Nacional para o Desenvolvimento Humano está a contribuir para acabar com a pobreza e exclusão social dos cidadãos mais vulneráveis ​​de Marrocos, especialmente as mulheres.

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O aumento dos padrões de vida e um amplo consenso político forneceram a estabilidade necessária para permitir que a economia tivesse um crescimento forte e se diversificasse. De forma lenta mas segura, o rendimento nacional está a tornar-se menos dependente da agricultura, reduzindo assim a vulnerabilidade dos marroquinos à escassez de chuvas e a colheitas fracassadas. O país está a desenvolver uma sólida indústria de transformação, especialmente de fertilizantes, com base, em parte, no facto de possuir as maiores reservas de fosfato a nível mundial. A indústria têxtil do país, que recupera agora de um abrandamento causado pela crise europeia, está a conquistar novos mercados de exportação. O mesmo se pode dizer relativamente ao turismo.

Na verdade, Marrocos pode orgulhar-se da sua estratégia de exportação. Apesar da fraca economia global, Marrocos vende os seus produtos em todo o mundo, contando com um considerável volume de exportações para França, EUA, Brasil, Estados do Golfo e China. O país tem acordos de comércio livre com a Europa, a Turquia, a Jordânia, os Emirados Árabes Unidos, o Egipto, a Tunísia e - único na região - os EUA.

Marrocos possui infra-estruturas sólidas, um sistema bancário sólido, estabilidade nas finanças públicas, inflação baixa e uma taxa de desemprego controlável. Apesar da fuga de capitais de grande parte da região, o investimento estrangeiro continua a ser aplicado no país.

É evidente que Marrocos beneficia do facto de ser um país estável numa região conturbada. Contudo, os seus interesses a longo prazo consistem em ter vizinhos politicamente estáveis que adoptem reformas económicas semelhantes, abrindo assim caminho para uma zona de comércio livre que traria benefícios a toda a região.

Esta perspectiva regional tem vindo a ser promovida desde que Mohammed subiu ao trono, em 1999. Parte importante da sua estratégia tem sido o incentivo das relações económicas intra-africanas. Marrocos já disponibiliza competências em matéria de finanças, telecomunicações, energia, agricultura e segurança alimentar em todo o continente, na verdade, o país é, actualmente, o segundo maior investidor em África, a seguir a África do Sul.

O conhecimento do rei relativamente à vida cultural e espiritual da região torna-o num conselheiro de valor inestimável, especialmente no que diz respeito ao papel do Islão na sociedade moderna. Por exemplo, Marrocos ajuda a formar imãs para uma espécie de Islão aberto, facto que está a ajudar o Mali a virar a página dos massacres recentes. Este princípio de solidariedade regional estende-se à instalação, por parte de Marrocos, de hospitais militares não só no Mali, mas também em outras zonas de conflito, como o que foi instalado na Jordânia e que acolhe refugiados sírios.

Marrocos tem boas condições para promover a segurança e o desenvolvimento no noroeste de África, e mais além. A estabilidade política do país, a economia aberta e o equilíbrio das relações internacionais são cada vez mais consentâneos com os interesses regionais dos EUA e da Europa. Além disso, Marrocos é um aliado leal e de longa data dos EUA. O Ocidente faria bem em começar a cultivar um parceiro natural numa região tão perigosa e complexa como esta.

Tradução: Teresa Bettencourt

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