eichengreen166_Scott PetersonGetty Images_ukraine destruction Scott Peterson/Getty Images

Formulando um Plano Marshall para a Ucrânia

BERKELEY – Falar em um Plano Marshall para a Ucrânia é um esporte popular hoje em dia. O jogo começa quando alguém lança um número para o custo de reconstrução do país após os estragos da invasão russa – US$ 250 bilhões, US$ 500 bilhões ou US$ 1 trilhão, dependendo das suposições sobre o tamanho da destruição, o custo de cuidar dos refugiados e assim por diante. O custo total do Plano Marshall pós-Segunda Guerra Mundial é então comparado ao PIB dos EUA em 1948, quando o programa começou. Em geral, isso leva à conclusão de que o custo da reconstrução ucraniana em relação ao tamanho dos países doadores será mais ou menos o do Plano Marshall.

Esses tipos de comparações não são, de fato, o melhor uso da história do Plano Marshall. É impossível estabelecer um custo para a reconstrução enquanto houver incerteza sobre a duração da guerra e quanto território será controlado pelo governo legítimo da Ucrânia. Só porque os Estados Unidos estavam preparados para fornecer à Europa do pós-Segunda Guerra Mundial quase 5% de seu PIB de 1948, pulverizados ao longo de quatro anos, isso não diz nada sobre esse ser o volume certo de apoio à Ucrânia.

Outros aspectos dessa história são mais relevantes à situação da Ucrânia. É revelador, por exemplo, que os desembolsos do Plano Marshall tiveram início mesmo enquanto ainda havia alguns combates na Europa. Embora a Guerra Civil Grega tivesse continuado até o verão de 1949, a Grécia recebeu ajuda do Marshall em1948. Na verdade, a Grécia recebeu US$ 300 milhões já em 1947 sob os auspícios da Missão Americana de Ajuda à Grécia, cuja estrutura forneceu o modelo do Plano Marshall.

De modo semelhante, a ajuda à Ucrânia pode começar agora, embora deva ser usada com discrição. Consertar pontes que simplesmente serão destruídas de novo pela Rússia não serviria a propósito algum.

Também é importante lembrar que os fundos do Plano Marshall eram compostos por mais de 90% de doações e só 10% de empréstimos. Hoje há apelos para que as potências ocidentais garantam novos títulos do governo ucraniano. Isso reduziria os custos de empréstimos do governo para menos de dois dígitos e forneceria fundos para a reconstrução. Mas deixaria a Ucrânia ainda mais endividada, sendo que o país já enfrenta o desafio de reestruturar o legado de sua dívida. As garantias para empréstimos ucranianos adicionais seriam apenas uma forma de os governos ocidentais baratearem o auxílio à reconstrução.

Além disso, os EUA criaram uma agência independente para administrar o Plano Marshall. Livre das burocracias dos Departamentos de Estado e do Tesouro americanos, a Administração de Cooperação Econômica (ECA - Economic Cooperation Administration, no original em inglês) poderia avançar rapidamente. A instituição conseguiu aproveitar a experiência do setor privado, a começar por seu chefe, Paul Hoffman, presidente da Studebaker. Evitou envolvimentos com as Nações Unidas, em que a condição de membro da União Soviética teria causado problemas.

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Do mesmo modo, a ajuda à Ucrânia deve ser administrada por uma agência autônoma que responda aos governos doadores. Embora o órgão possa consultar e, idealmente, coordenar ações com o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, ele deve manter sua independência, dada a participação russa em ambas as organizações.

Os arquitetos do Plano Marshall reconheceram a necessidade de posse por parte dos beneficiários da ajuda, à medida que avançaram na base do “confie, mas verifique”. Governos europeus enviaram planos detalhados para gastar os recursos americanos. Estas foram as bases das dolorosas negociações com o ECA antes do desembolso dos fundos. Em países como a Grécia, onde havia temores de corrupção, o ECA tinha centenas de agentes integrados aos ministérios relevantes. As reformas administrativas foram um foco e um prerrequisito para a ajuda do Plano Marshall.

Os ucranianos serão compreensivelmente sensíveis à interferência estrangeira em sua reconstrução. Mas a supervisão externa é o preço da ajuda externa, particularmente na escala que a Ucrânia exigirá. O governo de Kiev pode oferecer segurança aumentando a transparência de seus gastos - expandindo, por exemplo, seu portal online de compras públicas ProZorro.

O Plano Marshall priorizou a reconstrução da capacidade de exportação. Reconheceu os efeitos revigorantes da competição internacional e os benefícios políticos da integração europeia. A Ucrânia quase certamente tem pela frente um longo caminho para o nirvana da adesão à UE. Mas a jornada pode ser acelerada se a ajuda ocidental for estruturada para alinhar as instituições e políticas ucranianas às da UE.

Por fim, o Plano Marshall permitiu à Europa dar um salto tecnológico de uma geração. A Europa estava décadas atrás dos EUA na adoção dos métodos de fabricação de rendimento de alta velocidade em que se baseou a era de ouro do crescimento econômico do pós-guerra. Em vez de apenas reconstruir a indústria européia nas linhas pré-guerra, foi feito um esforço para transferir o suprassumo da tecnologia de fabricação americana. Funcionários europeus, gerentes de fábrica e sindicalistas foram aos EUA como parte das Missões de Produtividade financiadas pelo Plano Marshall para aprender sobre essas técnicas e voltaram com novos conhecimentos, gerando benefícios tangíveis para o crescimento da produtividade.

De modo semelhante, a Ucrânia tem a chance de dar um salto de uma geração em termos de tecnologia - para deixar verde seu sistema de energia, modernizar sua infraestrutura de transporte e comunicações e atualizar seu planejamento urbano. Estas são tarefas prioritárias para os ucranianos. Mas o Ocidente pode e deve ajudar.

Tradução por Fabrício Calado Moreira

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