A brilhante contraofensiva dos militares ucranianos, que forçou as tropas russas a recuar no leste e no sul da Ucrânia, é um exemplo disso. Um exemplo menos brilhante é o esforço do Ocidente de usar sanções comerciais e financeiras para prejudicar a capacidade da Rússia de travar a guerra. Aqui, as coisas não correram conforme o planejado e agora está claro que a estratégia precisa ser ajustada. Para esse fim, identificamos vários passos que tornariam mais eficaz o regime de sanções do ocidente.
A salva de abertura daquele esforço parecia impressionante. Imediatamente após a invasão, os Estados Unidos, a União Europeia e seus aliados congelaram a maior parte das reservas internacionais da Rússia, excluíram a maioria de seus bancos do sistema de pagamento internacional SWIFT e proibiram a venda de muitos bens para a Rússia (incluindo peças de aeronaves e cruciais sistemas de armas). Eles também desajeitadamente tentaram reduzir a capacidade da Rússia de se financiar através das exportações de petróleo e gás: os EUA impuseram um embargo imediato ao petróleo, enquanto a UE anunciou que proibiria a maioria das importações russas de petróleo dentro de 6 a 8 meses.
Além disso, centenas de empresas estrangeiras anunciaram que estavam saindo do mercado russo. Mas enquanto as previsões iniciais antecipavam uma contração de dois dígitos do PIB e um colapso do rublo, isso não ocorreu. O Fundo Monetário Internacional espera que o PIB russo diminua 3,4% este ano, enquanto o rublo aumentou cerca de 20% em relação aos níveis anteriores à guerra.
Isso não quer dizer que as sanções lideradas pela UE-EUA não tenham afetado significativamente o poder de guerra do presidente russo, Vladimir Putin. Mas essas sanções certamente foram menos eficazes do que os governos dos EUA e da Europa esperavam. O que deu errado e o que poderia ser feito para se obter impacto maior?
As sanções financeiras visam alavancar o poder dos EUA e seus aliados sobre as finanças internacionais. Elas são particularmente eficazes quando usadas contra países que apresentam déficits em conta corrente. Ao impedir que esses países se autofinanciem, as sanções financeiras causam um choque macroeconômico que normalmente leva a um colapso nas importações, na produção e na moeda local.
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Mas as sanções financeiras são muito menos eficazes contra países que, como a Rússia, têm superávits em conta corrente, porque eles podem pagar as importações com os ganhos das exportações. Embora as sanções financeiras reduzam a eficiência econômica e afetem a capacidade de financiar grandes e complexos projetos, esses efeitos se aplicam ao crescimento futuro, não à produção atual.
A eficácia das sanções comerciais também depende do contexto em que são impostas. Em particular, seu sucesso depende da capacidade de cada uma das partes de redirecionar suas exportações ou importações. Sancionar as exportações para a Rússia não é o mesmo que proibir as importações da Rússia em termos de custos e benefícios.
Antes da guerra, a UE era quase tão dependente das importações de energia russa quanto a Rússia da venda de seu petróleo e gás para a UE, resultando em um monopólio bilateral de fato. Mas enquanto a gigante estatal de petróleo Rosneft mantém uma dominante posição no lado russo, a UE tem muitas empresas importadoras de energia em 27 estados membros. Assim, embora a Rússia possa agir, a UE só pode se esforçar para agir em conjunto. Por outro lado, antes da guerra, a Rússia obtinha 40% de suas importações da UE, enquanto o mercado russo representava 4% das exportações europeias .
Os números parecem ainda mais favoráveis à coalizão anti-Putin considerando-se que os EUA e a UE – juntamente com os restantes membros do G7, Taiwan, Coreia do Sul e Austrália – dominam muitas indústrias, incluindo aeronaves, máquinas e instrumentos médicos. Para 30% dos produtos importados pela Rússia, a participação da coalizão no mercado russo ultrapassou 70% antes da guerra. Isso permite que os EUA e seus aliados restrinjam o acesso da Rússia a suprimentos críticos, que, de acordo com documentos russos internos, podem produzir devastadores efeitos econômicos nos próximos anos.
Mas as sanções atuais não aproveitam todo o potencial de restringir as exportações para a Rússia. Como essas sanções são direcionadas para bens de capital, elas afetam a produção apenas gradualmente, à medida que os existentes equipamentos russos se depreciam e exigem substituição. Como tal, eles não têm o efeito imediato na produção que a interrupção dos principais insumos intermediários teria. Dada a urgência do esforço de guerra, devemos identificar e interromper as importações que a Rússia precisa neste momento.
Os membros da coalizão anti-Putin também parecem ter sérios problemas de coordenação. Em meados de outubro, a UE havia proibido a exportação de cerca de 37% de todos os produtos fabricados na Europa para a Rússia, segundo dados do Global Trade Alert. Esses produtos representam 45% das exportações da UE antes da guerra para a Rússia. Mas quase metade dos produtos proibidos pela UE não estão sujeitos às restrições de exportação dos EUA e vice-versa, permitindo que a Rússia substitua os fornecedores da coalizão.
Em um recente artigo, desenvolvemos uma estrutura para avaliar a eficácia das atuais restrições à exportação, sintetizando nossos insights em um único critério que permite priorizar proibições de exportações de produtos estritamente definidos para a Rússia. Nossa linha de fundo é simples: as sanções às exportações para a Rússia são em geral muito eficazes, levando a uma perda percentual do PIB que é cerca de 100 vezes maior para a Rússia do que para os países sancionadores.
Se as sanções fossem baseadas em nosso critério e melhor coordenadas entre os membros da coalizão, os custos incorridos pela Rússia aumentariam cerca de 60% sem custo extra para os países sancionadores. Além disso, há uma margem significativa para aumentar as perdas da Rússia restringindo mais produtos.
A guerra na Ucrânia está sendo travada tanto no campo de batalha quanto na frente econômica, com milhões fazendo sacrifícios para proteger o país e sua democracia. Precisamos apoiá-los, garantindo que as sanções comerciais sejam tão eficazes quanto possível.
Tradução de Anna Maria Dalle Luche, Brazil
Ricardo Hausmann, ex-ministro do planejamento da Venezuela e ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, é professor da Escola de Governo John F. Kennedy de Harvard e diretor do Laboratório de Crescimento da Universidade de Harvard.
Ulrich Schetter é pós-doutorando no Laboratório de Crescimento da Universidade de Harvard.
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Though Donald Trump attracted more support than ever from working-class voters in the 2024 US presidential election, he has long embraced an agenda that benefits the wealthiest Americans above all. During his second term, however, Trump seems committed not just to serving America’s ultra-rich, but to letting them wield state power themselves.
The reputation of China's longest-serving premier has fared far better than that of the Maoist regime he faithfully served. Zhou's political survival skills enabled him to survive many purges, and even to steer Mao away from potential disasters, but he could not escape the Chairman's cruelty, even at the end of his life.
reflects on the complicated life and legacy of the renowned diplomat who was Mao Zedong’s dutiful lieutenant.
CAMBRIDGE – O lendário marechal de campo prussiano, Helmuth von Moltke, o Velho, observou que nenhum plano de batalha sobrevive ao primeiro contato com o inimigo. A implicação era que os comandantes que vencem as guerras não são necessariamente aqueles com os melhores planos iniciais, mas aqueles que se adaptam rapidamente às novas informações e às condições do terreno.
A brilhante contraofensiva dos militares ucranianos, que forçou as tropas russas a recuar no leste e no sul da Ucrânia, é um exemplo disso. Um exemplo menos brilhante é o esforço do Ocidente de usar sanções comerciais e financeiras para prejudicar a capacidade da Rússia de travar a guerra. Aqui, as coisas não correram conforme o planejado e agora está claro que a estratégia precisa ser ajustada. Para esse fim, identificamos vários passos que tornariam mais eficaz o regime de sanções do ocidente.
A salva de abertura daquele esforço parecia impressionante. Imediatamente após a invasão, os Estados Unidos, a União Europeia e seus aliados congelaram a maior parte das reservas internacionais da Rússia, excluíram a maioria de seus bancos do sistema de pagamento internacional SWIFT e proibiram a venda de muitos bens para a Rússia (incluindo peças de aeronaves e cruciais sistemas de armas). Eles também desajeitadamente tentaram reduzir a capacidade da Rússia de se financiar através das exportações de petróleo e gás: os EUA impuseram um embargo imediato ao petróleo, enquanto a UE anunciou que proibiria a maioria das importações russas de petróleo dentro de 6 a 8 meses.
Além disso, centenas de empresas estrangeiras anunciaram que estavam saindo do mercado russo. Mas enquanto as previsões iniciais antecipavam uma contração de dois dígitos do PIB e um colapso do rublo, isso não ocorreu. O Fundo Monetário Internacional espera que o PIB russo diminua 3,4% este ano, enquanto o rublo aumentou cerca de 20% em relação aos níveis anteriores à guerra.
Isso não quer dizer que as sanções lideradas pela UE-EUA não tenham afetado significativamente o poder de guerra do presidente russo, Vladimir Putin. Mas essas sanções certamente foram menos eficazes do que os governos dos EUA e da Europa esperavam. O que deu errado e o que poderia ser feito para se obter impacto maior?
As sanções financeiras visam alavancar o poder dos EUA e seus aliados sobre as finanças internacionais. Elas são particularmente eficazes quando usadas contra países que apresentam déficits em conta corrente. Ao impedir que esses países se autofinanciem, as sanções financeiras causam um choque macroeconômico que normalmente leva a um colapso nas importações, na produção e na moeda local.
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Mas as sanções financeiras são muito menos eficazes contra países que, como a Rússia, têm superávits em conta corrente, porque eles podem pagar as importações com os ganhos das exportações. Embora as sanções financeiras reduzam a eficiência econômica e afetem a capacidade de financiar grandes e complexos projetos, esses efeitos se aplicam ao crescimento futuro, não à produção atual.
A eficácia das sanções comerciais também depende do contexto em que são impostas. Em particular, seu sucesso depende da capacidade de cada uma das partes de redirecionar suas exportações ou importações. Sancionar as exportações para a Rússia não é o mesmo que proibir as importações da Rússia em termos de custos e benefícios.
Antes da guerra, a UE era quase tão dependente das importações de energia russa quanto a Rússia da venda de seu petróleo e gás para a UE, resultando em um monopólio bilateral de fato. Mas enquanto a gigante estatal de petróleo Rosneft mantém uma dominante posição no lado russo, a UE tem muitas empresas importadoras de energia em 27 estados membros. Assim, embora a Rússia possa agir, a UE só pode se esforçar para agir em conjunto. Por outro lado, antes da guerra, a Rússia obtinha 40% de suas importações da UE, enquanto o mercado russo representava 4% das exportações europeias .
Os números parecem ainda mais favoráveis à coalizão anti-Putin considerando-se que os EUA e a UE – juntamente com os restantes membros do G7, Taiwan, Coreia do Sul e Austrália – dominam muitas indústrias, incluindo aeronaves, máquinas e instrumentos médicos. Para 30% dos produtos importados pela Rússia, a participação da coalizão no mercado russo ultrapassou 70% antes da guerra. Isso permite que os EUA e seus aliados restrinjam o acesso da Rússia a suprimentos críticos, que, de acordo com documentos russos internos, podem produzir devastadores efeitos econômicos nos próximos anos.
Mas as sanções atuais não aproveitam todo o potencial de restringir as exportações para a Rússia. Como essas sanções são direcionadas para bens de capital, elas afetam a produção apenas gradualmente, à medida que os existentes equipamentos russos se depreciam e exigem substituição. Como tal, eles não têm o efeito imediato na produção que a interrupção dos principais insumos intermediários teria. Dada a urgência do esforço de guerra, devemos identificar e interromper as importações que a Rússia precisa neste momento.
Os membros da coalizão anti-Putin também parecem ter sérios problemas de coordenação. Em meados de outubro, a UE havia proibido a exportação de cerca de 37% de todos os produtos fabricados na Europa para a Rússia, segundo dados do Global Trade Alert. Esses produtos representam 45% das exportações da UE antes da guerra para a Rússia. Mas quase metade dos produtos proibidos pela UE não estão sujeitos às restrições de exportação dos EUA e vice-versa, permitindo que a Rússia substitua os fornecedores da coalizão.
Em um recente artigo, desenvolvemos uma estrutura para avaliar a eficácia das atuais restrições à exportação, sintetizando nossos insights em um único critério que permite priorizar proibições de exportações de produtos estritamente definidos para a Rússia. Nossa linha de fundo é simples: as sanções às exportações para a Rússia são em geral muito eficazes, levando a uma perda percentual do PIB que é cerca de 100 vezes maior para a Rússia do que para os países sancionadores.
Se as sanções fossem baseadas em nosso critério e melhor coordenadas entre os membros da coalizão, os custos incorridos pela Rússia aumentariam cerca de 60% sem custo extra para os países sancionadores. Além disso, há uma margem significativa para aumentar as perdas da Rússia restringindo mais produtos.
A guerra na Ucrânia está sendo travada tanto no campo de batalha quanto na frente econômica, com milhões fazendo sacrifícios para proteger o país e sua democracia. Precisamos apoiá-los, garantindo que as sanções comerciais sejam tão eficazes quanto possível.
Tradução de Anna Maria Dalle Luche, Brazil
Ricardo Hausmann, ex-ministro do planejamento da Venezuela e ex-economista-chefe do Banco Interamericano de Desenvolvimento, é professor da Escola de Governo John F. Kennedy de Harvard e diretor do Laboratório de Crescimento da Universidade de Harvard.
Ulrich Schetter é pós-doutorando no Laboratório de Crescimento da Universidade de Harvard.