willoughby2_WILLIAM WESTAFP via Getty Images_farms WILLIAM WEST/AFP via Getty Images

Vem aí a revolução do sistema alimentar

LONDRES – O sector agrícola está a chegar à ruptura. Por todo o mundo, os criadores de gado abandonam os terrenos, os legisladores visam os efeitos ambientais e sociais nocivos da pecuária industrial e os consumidores estão a abandonar a carne e a adoptar alternativas mais saudáveis e sustentáveis. Com o sector a aproximar-se de uma encruzilhada, os decisores no governo, na indústria e na sociedade civil terão de estar atentos aos ensinamentos de transições importantes noutras indústrias e de começar a preparar-se.

A preparação obrigará a uma inventariação cuidadosa das necessidades dos agricultores, dos trabalhadores rurais e dos consumidores. Ao mesmo tempo que os agricultores vão envelhecendo e trocando os terrenos por outras actividades ou pela reforma, o sector agrícola debate-se para atrair novos entrantes, e não só nos países mais ricos e industrializados. Na Europa, por cada empresário agrícola com menos de 40 anos existem três com mais de 65 anos; e da África Subsaariana à Ásia, à América Latina e às Caraíbas, o número dos idosos residentes em zonas rurais aumenta enquanto diminui o número dos jovens.

Ao mesmo tempo, as explorações agrícolas estão a aumentar de dimensão, e as pequenas operações estão a ser pressionadas. Devido às desafiantes características económicas da agricultura e ao poder de um pequeno número de gigantes estabelecidos na indústria, as explorações agrícolas estão a ser consolidadas em nome da eficiência e das economias de escala. Como resultado, a União Europeia perdeu mais de um terço das suas explorações agrícolas e 40% das suas explorações pecuárias entre 2005 e 2020. Aos legisladores falta considerar se e como devem proteger as explorações familiares, e como evitar os riscos de violações do bem-estar dos animais, de condições precárias de trabalho e das doenças inerentes à pecuária industrial.

Os legisladores também estão a despertar para o convincente conjunto de provas sobre os danos ambientais da produção industrial de carne. Enquanto a agricultura é responsável por quase um terço de todas as emissões de gases com efeito de estufa, só a pecuária (e especialmente o gado bovino) contribui quase 15%. Além disso, a agro-pecuária é a principal causa da desflorestação e da perda da biodiversidade. As florestas são derrubadas para libertar terrenos, não só para pastagens, mas também para as culturas adicionais necessárias à alimentação desses animais. Só a produção de carne de vaca ocupa perto de 60% dos terrenos usados para a agricultura, apesar de contribuir menos de 2% para o total de calorias consumidas em todos o mundo.

Em Espanha, a poluição decorrente da agro-pecuária industrial tornou-se tão generalizada que o estrume de porco contaminou quase um quarto de todos os lençóis freáticos e águas superficiais do país. Não admira que os reguladores estejam a procurar com urgência formas para diminuir a poluição agro-pecuária e para produzir mais em menos terreno. Dado o risco acrescido de propagação de doenças infecciosas de animais para humanos (zoonoses) representado pela agro-pecuária industrial, o impulso para uma regulamentação mais restritiva só aumentará.

Apesar de a pecuária e a agricultura terem sido tradicionalmente excluídas da maioria dos regimes para a redução de emissões, legisladores na Dinamarca, nos Países Baixos e na Nova Zelândia já estão a trabalhar no sentido de colmatar esta lacuna, e brevemente muitos outros países os seguirão. A questão agora não é saber se haverá uma regulamentação mais restrita na indústria pecuária, mas sim que configuração e forma tomará. Tanto os agricultores como as empresas devem estar preparados para se adaptarem a alterações que são já inevitáveis.

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Finalmente, também os consumidores se estão a afastar da carne e dos lacticínios. Durante a última década, o consumo médio de carne por pessoa diminuiu quase 17% no Reino Unido e 11% na Alemanha. Não obstante um abrandamento recente, ainda está a crescer a adopção das proteínas alternativas, uma fonte de alimento que só produz uma pequena fracção dos efeitos negativos para o ambiente e o bem-estar animal dos produtos tradicionais de carne. As vendas de carne e leite de origem vegetal já estão a crescer de forma generalizada na UE, mas também em países como a Tailândia e a África do Sul. Quando estes produtos atingirem a paridade de gosto e de preço com a carne, a sua adopção pelos consumidores poderá na verdade acelerar de forma muito rápida.

As políticas públicas também têm um papel a desempenhar. A agro-pecuária tende a ser fortemente subsidiada em muitos países, devido às margens reduzidas e elevados níveis de endividamento do sector. Com a queda das vendas, a diminuição das receitas deverá ter implicações significativas para o bem-estar dos agricultores e de outros trabalhadores relacionados com os sistemas industriais de produção de carne.

Tendo em conta as complexidades associadas a estas tendências interligadas, os legisladores e líderes corporativos precisam de começar já a encarar este problema. A experiência de outros sectores que já iniciaram a descarbonização (de onde se destaca o sector energético) demonstra que uma transição planificada e orientada é sempre melhor que um processo ad hoc e não administrado.

Basta pensarmos nos protestos do ano passado dos agricultores nos Países Baixos ou na Nova Zelândia para vermos a forma abrupta com que as políticas climáticas podem ser perturbadas quando os trabalhadores e as comunidades se sentem excluídos. Infelizmente, ainda só possuímos uma compreensão limitada da melhor forma para integrar a política e a acção empresarial para reduzirmos as emissões do sistema alimentar ao mesmo tempo que protegemos as subsistências. Como resistir à mudança não é opção, os legisladores e os líderes empresariais fariam bem em começar a pensar como a vão gerir nos próximos anos.

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